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TEMPOS DE CÓLERA

A Humanidade é uma revolta de escravos (Alberto Caeiro, Poemas)

O Património Genético Português - A História Humana Preservada nos Genes

31.10.25 | Manuel

 Por Por Luísa Pereira e Filipa M. Ribeiroarabes.jpg

Os genes berberes e árabes 

Existem linhagens mitocondriais presentes na população portuguesa e ausentes no resto da Europa designadas por U6. Este haplogrupo foi nomeado Berbere, uma vez que a sua distribuição se restringe ao Norte de África, onde a sua frequência ronda os 10-20%, sendo esporádica no Médio e no Próximo Oriente e na Ibéria. Pensa-se que este haplogrupo é uma reminiscência do povo ancestral berbere, que habitava o Norte de África antes da conquista árabe, no século VII. Na actualidade ainda existem algumas populações berberes nos países norte-africanos, sempre em comunidades reduzidas e mais ou menos isoladas, dedicando-se a actividades tradicionais como a agricultura, a pastorícia e o artesanato. Alguns destes grupos mantêm uma linguagem berbere, enquanto outros já adoptaram o árabe. Geneticamente, e mesmo em termos culturais (arqueologicamente), o Norte de África é muito mais aparentado com a Eurásia do que com a África subsariana. Tudo indica que a colonização do Norte de África foi efectuada por migrações Back to Africa» do Homem Moderno, a partir do Próximo Oriente, através do Levante, numa época comum à migração para a Europa, há cerca de 40.000 anos. Neste caso, parece que a rota mais a Sul, através do Mar Vermelho, não participou nesta migração «Back to Africa» colonizadora do Norte de África.

Deste modo, muito do património genético do Norte de África é comum ao da Europa, podendo existir linhagens diversas em ambos os lados do Mar Mediterrâneo, mas que descenderam de um ancestral comum no Próximo Oriente. É o caso da linhagem U6, que se dispersou no Norte de África, enquanto a sua irmã U5 se dispersou na Europa. Torna-se assim muito mais difícil destrinçar geneticamente as influências norte-africanas na constituição genética portuguesa, pela partilha da maior parte do património genético fundador. Ficámos limitados a essas linhagens que tiveram uma evolução divergente nos dois lados do Mediterrâneo, da qual o U6 é o melhor exemplo até ao momento. Com os desenvolvimentos recentes da análise do ADN mitocondrial, é de prever que novas achegas sejam possíveis num futuro próximo para outras linhagens.

A observação do haplogrupo U6 quer no Médio e no Próximo Oriente, quer na Ibéria, indica a troca de linhagens com o Norte de África. Em Portugal, o U6 atinge as seguintes frequências: 5% no Norte, 3% no Centro e 2% no Sul. Apesar de estas frequências parecerem muito baixas, não se deve esquecer que a frequência do U6 no Norte de África é também muito reduzida, entre 4% a 28%. Corrigindo para estes valores no Norte de África, uma frequência de 5% em Portugal representaria no mínimo 14% e no máximo 20% de aporte norte-africano.

Quando se compara a diversidade das linhagens U6 observadas em Portugal, elas são bastante divergentes entre si, parecendo indicar uma entrada recente. Seria tentador estabelecer o domínio islâmico de Portugal, desde o século VIII até ao século XIII, como o movimento mais provável para a entrada aparentemente recente dessas linhagens U6. Simplesmente, o gradiente de frequências é oposto ao que seria de esperar, dada a mais forte e longa influência islâmica no Sul do país. Como é que se poderia explicar essa maior frequência de linhagens norte-africanas no Norte de Portugal? As hipóteses são muitas, as certezas inexistentes. Muitas evidências históricas podem ser apontadas, quer favoráveis, quer desfavoráveis.

Em primeiro lugar, poder-se-ia apontar para um enviesamento no tipo de cruzamento misto. Durante o domínio islâmico eram feitos numerosos raides, quer de cristãos a islâmicos, quer de islâmicos a cristãos, com conversão dos prisioneiros a escravos. Seria então mais predominante o cruzamento de homem cristão com mulher islâmica no Norte, que sempre teve pouquíssima influência islâmica, e de homem islâmico com mulher cristã no Sul. Outra curiosidade é a existência de mourarias, guetos de islâmicos onde a endogamia religiosa seria fortíssima, apenas no Sul; no Norte estão é referidas algumas doações de terras a casais islâmicos pura a formação de uma comunidade numa região despovoada.

Em segundo lugar, pode ter sido uma migração mais antiga, ou várias ao longo do tempo, a responsável pela Intrusão de U6. Apenas 15 km separam as Colunas de Hércules, entre Gibraltar e Ceuta, e os contactos entre os dois lados devem ter sido frequentes e contínuos. Alguns dados novos de ADN mitocondrial têm mostrado que os haplogrupos que se expandiram a partir da Ibéria para o resto da Europa, após o Último Máximo Glaciar, também atingiram o Norte de África, atestando a passagem destas linhagens da Ibéria para o Sul. É credível que movimentos antigos, do Norte de África para Norte, também tenham ocorrido. Mas a baixa frequência de U6 não permite uma datação precisa, excepto nas Canárias.

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As Canárias, ao contrário dos Açores e da Madeira, estavam habitadas, quando os ibéricos lá chegaram, por um povo denominado Guanches. Estes eram prováveis descendentes dos berberes do Norte de África e datações arqueológicas indicam a sua chegada ao arquipélago há cerca de 2500 anos. Existe um grupo tipicamente canário dentro da linhagem U6 (denominado U6b1), que acumulou diversidade específica neste arquipélago, atingindo uma frequência de 8% na população actual. A datação dessa diversidade aponta para um tempo de expansão de 2800±900 anos, dentro das estimativas apontadas pela Arqueologia.

A frequência de linhagens maternas U6 na Madeira e nos Açores é baixa, 3,9% e 1,7%, respectivamente.

Para a componente genética masculina, os primeiros trabalhos baseados num pequeno número de marcadores apontavam para uma influência norte-africana crescente de Norte a Sul de Portugal. No entanto, a descoberta de novos marcadores, que permitiram uma melhor caracterização molecular das linhagens paternas, mostrou posteriormente haver uma homogeneidade na distribuição da linhagem paterna do Norte de África (designada E3b1b) em Portugal continental, na Madeira e nos Açores, rondando os 5-6%, quando nas populações do Noroeste de África atinge aproximadamente 75%.

A aceitarmos movimentos pré-históricos para a introdução das linhagens norte-africanas em Portugal, estaremos a desvalorizar o domínio islâmico em termos genéticos e demográficos?

Podia alegar-se uma maior proporção de machos conquistadores vindos do Norte de África a acasalar com nativas, mas há documentos históricos que atestam a vinda de um primeiro contingente masculino, em grande parte berbere, seguido pelas suas famílias. Os Árabes, que no espaço de um século conquistaram todo o Norte de África e que iniciaram a invasão quase totalmente bem-sucedida da Península Ibérica, seriam uma elite menos numerosa nesses exércitos que atravessaram o Mediterrâneo. Há ainda documentos que atestam que as terras menos férteis do Norte de Portugal teriam sido atribuídas aos berberes, ficando os Árabes com as terras mais rentáveis do Sul. Esta evidência, a ser verdadeira, poderia explicar a maior proporção da linhagem U6 no Norte de Portugal, remetendo os Árabes para o Sul, a fim de fundarem os importantes Alcazares, como Beja, Évora, Santarém, Lisboa, em domínio mais organizado, social e culturalmente, e com a prática da poligamia tradicional dos grandes soberanos árabes.

(...)

Como o caso ja referido daquela família de Mértola, que possui uma linhagem berbere e uma linhagem mais frequente no Pr6ximo Oriente, o ADN dos restantes naturais do concelho de Mértola revela ainda hoje uma maior percentagem de linhagens U6, as ditas linhagens berberes, relativamente ao resto do País — por volta de 9%, chegando a ser mais elevada do que em certas povoações actuais berberes e árabes do Norte de África. Além desta maior frequência das linhagens berberes, as linhagens características do Próximo/Médio Oriente também estavam presentes numa frequência muito mais elevada em Mértola do que no resto do País (33% versus 11%), com redução das linhagens subsarianas em Mértola (6%) relativamente ao resto da região sul (11%).

Estas mais elevadas frequências de linhagens norte-africanas e do Próximo/Médio Oriente na população actual de Mértola parecem atestar a importância passada deste local do Sul de Portugal para a entrada de gentes e seus genes do mundo mediterrânico. O importante porto fluvial que Mértola constituiu para Fenícios, Cartagineses, Romanos e Islâmicos, no centro de uma importante rede de minas de minério (como as minas de São Domingos, um grande centro de extracção de pirite cúprica) fez de Mértola um enclave interessante para o estabelecimento de algumas famílias do Norte de África e do Próximo/Médio Oriente. A sedentarização destas famílias seria a chave para o estabelecimento das rotas comerciais mediterrânicas. Talvez a partir de Mértola se espalhassem a cultura e o comércio das novas gentes aqui chegadas para o resto do País. Como Mértola, existiriam outros entrepostos portugueses, mas aquela localidade alentejana permaneceu suficientemente homogénea ao longo dos tempos, de modo que esse sinal genético de outras eras permanece no património genético actual. O tema está longe de estar esclarecido, mas torna-se cada vez mais claro que uma visão simples das invasões islâmicas não se aproxima de modo algum da realidade.

Continuação de O Património Genético Português - As influências de África e do Mediterrâneo: escravas, mouras e judias

(O Património Genético Português – A história humana preservada nos genes. Luísa Pereira e Filipa M. Ribeiro. Gradiva, 2009).

Assembleia da República mais pequena com gente mais gorda

27.10.25 | Manuel

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Quando António José Seguro, líder do PS e da oposição ao governo de Passos Coelho/Paulo Portas/PSD/CDS, apresentou a proposta de diminuição do número de deputados na Assembleia da República, talvez já prevendo a falência do seu partido. Se, então, a proposta tivesses avançado, muito provavelmente o PS teria agora ainda menos deputados. Estávamos em 2012 e ainda não era certo se o governo aguentaria até ao fim do mandato, atendendo às contradições no seu seio, que levaram à “demissão irreversível” de Portas, e às medidas de austeridade impostas pela troika. Perspectivava-se na altura o surgimento de um governo de “Salvação Nacional”, tal como agora Seguro defende, caso o então PR Cavaco Silva interviesse com a dissolução do Parlamento.

O inefável Seguro (pouco), alegado chefe da também alegada oposição, tirou um coelho da cartola para melhorar a democracia em Portugal e, presume-se, combater ou pelo menos aligeirar a austeridade lançada sobre o povo português, não exactamente sobre “todos” os portugueses: reduza-se o número de deputados! Esta história de melhorar a qualidade da democracia portuguesa por via da redução do número de deputados, proposta apresentada por parte daqueles que mais a têm abandalhado e se têm aproveitado do regime para encher os bolsos e os lucros dos capitalistas, é velha e relha e só tem um objectivo: reforçar o controlo e o poder por parte dos partidos do arco do poder, ou seja, restringir ainda mais a parca e reles democracia parlamentar burguesa.

Esta proposta é de agrado e bem acolhida pela extrema-direita, também denominada “direita radical” por alguns dirigentes laranjas, acoitada no PSD e que o PS como capacho de todos dá aval. Se vier a vingar teremos um Parlamento só constituído por deputados dos dois partidos de alterne que, de imediato, irão aumentar os seus escandalosos vencimentos e prebendas, fazendo disparar o orçamento parlamentar que vai em cerca de 100 milhões de euros (95 394 581 euros, sendo 2 093 650 para pagamento de subsídios de férias e de Natal ao pessoal) e, consequência inevitável e também decorrente das políticas que sempre defenderem, afastarem-se ainda mais do povo que dizem defender, mas que jamais deixaram de calcar a pés juntos desde o primeiro dia que, pela primeira vez, foram eleitos em 1976.

Se o orçamento da Assembleia da República não tem deixado de aumentar desde 1976, assim como o da Presidência da República que, desde a mesma altura, aumentou só 150 vezes, deve-se não ao número de deputados que, comparado com outros países europeus com a mesma população e com regime parlamentares semelhantes, até não são muitos, a questão coloca-se no montante dos salários, partindo do principio que tal gente está a vender a sua força de trabalho, o que também não é verdade, e das demais prebendas que podem levar a que um deputado em regime de exclusividade possa enfiar nos bolsos todos os meses cerca de 5 000 euros. Cinco mil euros! Mais de 10 vezes o salário mínimo nacional, e muitos trabalhadores, nomeadamente jovens recém-licenciados, nem isso ganham!

A despesa é grande porque esta gente não merece o que ganha, porque o que fazem não é em prole do povo português que os elegeu com o seu voto, mas no interesse das grandes empresas e dos bancos a que muitos deles se encontram ligados através de vários meios, entre eles, o que tem chocado a opinião pública, os grandes escritórios de advogados. Se um deputado da República auferisse o salário médio de um trabalhador, mesmo da Função Pública, que anda pelos 900 euros ilíquidos, e perdesse as regalias do género de reforma vitalícia após 12 anos de parasitismo, quase de certeza que haveria menos candidatos à AR com a profissão de advogado, engenheiro ou com “dr” mesmo feito nas “Novas Oportunidades” do Sócrates ou das “equivalências” do Relvas.

Esta proposta, agora relembrada pelo PS, levanta outra questão: qual tem sido o papel da AR desde 1976 até ao momento presente? Ora, e os factos provam-no à evidência, o papel dos deputados tem sido o de apoiar as propostas das direcções dos seus partidos e nomeadamente dizer ámen às políticas dos seus governos quando os seus partidos estão no poder executivo. E qualquer voz que ouse discordar, por muito ligeira que seja essa discordância, é de imediato silenciada, ou pior ainda, o próprio deputado discordante arrepia caminho para não perder o tacho. Não há lugar para discordância, o Parlamento não tem servido para denunciar o que vai mal no reino, mas para apoiar e reafirmar a política dos partidos do arco do poder. Mesmo os partidos da dita “oposição radical”, que nunca foram governo após 1976, não ousam colocar em causa o regime porque ser deputado sabe bem e é uma fonte de rendimento para o partido.

Resumindo, o Parlamento é um moinho de palavras ocas que serve para iludir os trabalhadores de que há democracia porque de tantos em tantos anos colocam na urna um papelinho com a indicação do partido que lhes parece ir resolver os problemas, só quando dão pelo logro não têm maneira de o pôr de lá para fora. No acto eleitoral repete-se a ilusão e a demagogia, reforçada pelo aparelho de alienação da opinião pública que são todos os media, principalmente as televisões, propriedade de grandes grupos económicos ou directamente controlados pelo partido do governo.

Este regime de democracia parlamentar tem sido o meio mais eficaz de enganar os trabalhadores de molde a convencê-los a deixarem-se explorar voluntaria e, de preferência, alegremente. Todos os grandes assuntos e medidas são acordadas e decididas nos bastidores, entre os dois partidos de alterne e segundo as instruções dos seu amos, os capitalistas – a espera dos deputados, já em outra legislatura, pela presença do merceeiro Belmiro de Azevedo é mais que simbólica.

Mas os tempos estão a mudar, os trabalhadores e o povo estão a ir vezes demais à rua a fim de expressar a sua revolta contra as políticas celeradas deste governo cripto-fascista e, o que mais incomoda e atemoriza a classe dominante e os seus políticos, expressar a sua raiva contra estes partidos que sempre estiveram no governo e que são os principais responsáveis pelo estado de miséria a que chegamos e de venda do país a uma Europa dos capitalistas chefiada por Alemanha hegemonista e ao imperialismo representado pelo FMI.

Perante os tempos difíceis que se avizinham, para os trabalhadores mas também para a burguesia e os seus partidos, o PS está a pôr as barbas de molho, antecipando uma reforma que contraria o que apregoa, mas que visa salvaguardar a sua sobrevivência. Não se sabe ainda ao certo se este governo odiado será substituído por um governo de “salvação nacional” (do capitalismo e da burguesia nacional), como se esforça um bastonário da Ordem dos Advogados (que também não é por acaso), ou se o senhor Silva irá dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas; decisão que não será antes da aprovação do Orçamento para 2013, documento importante para a burguesia garantir a espoliação do povo português para o ano que vem e que tem de ser aprovado a todo o custo.

Com um governo de “salvação nacional” até 2015, quando se deveria realizar o próximo sufrágio legislativo, a democracia ficará suspensa durante este tempo todo e não apenas por seis meses como aventara a cacique do PSD, Ferreira Leite. Durante este tempo, não muito diferente como agora acontece, o governo irá governar em ditadura, como aconteceu com os governos de João Franco nos últimos tempos da monarquia; ou seja, sem necessidade do Parlamento, embora este continue de portas abertas e com os representantes da Nação, alegres e contentes, a enfiar nos bolsos os vencimentos e as prebendas e a garantir o futuro com pornográficas reformas vitalícias. A fraqueza deste regime parlamentar burguês está bem patente neste governo, eleito com o voto de pouco mais de 2 milhões de portugueses, beneficiando de um apoio maioritário parlamentar, no entanto, já tem os dias contados a menos de metade do período de vida previsto e correndo o risco de cair na rua. Pela singela razão de que tem governado contra os interesses do povo trabalhador.

O PS ao levantar a questão do número de deputados pensa que está acautelar a sua sobrevivência, mas está apenas a abreviar o seu tempo de vida; aliás, o seu prazo de validade que há muito expirou, lá vai o tempo do “socialismo com democracia”, em oposição aos PC´s de inspiração ex-URSS, que seriam socialismo com autoritarismo. Daí igualmente o seu envolvimento no recente Congresso das Alternativas, com o propósito de se remaquilhar. O PS está condenado a seguir o caminho trilhado por um PS italiano ou, mais recentemente, do grego PASOK, pela simples razão que sempre governaram e sempre defenderam políticas contra os trabalhadores e o povo.

O PS como partido típico da pequena burguesia, usualmente utilizado ou para aplicar as políticas do grande capital ou de escada por parte de alguns partidos que se arvoram do comunismo para se alcandorarem ao aparelho de estado burguês, está condenado a desaparecer nem que seja pela perda da sua base social, a tão famigerada e indefinida “classe média”, que graças a estas políticas de austeridade está em processo rápido de proletarização. Esta proletarização mais não é que o resultado da transformação capitalista da economia e da sociedade, processo que se acelerou graças à nossa entrada na então CEE e que, agora com União Europeia dos bancos e dos estados, está ser levado ao extremo com a transformação de países formalmente independentes em colónias do IV Reich e do imperialismo.

Devemos estar a assistir ao toque de finados do regime saído da quartelada de Abril, motivo de preocupação, mas não de desespero, porque há uma saída para os que trabalham e produzem, e essa saída foi mostrada pelo proletariado parisiense há pouco mais de 140 anos.

PS: “Os partidos da oposição acusaram, esta quarta-feira, o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, de "desrespeitar" a Assembleia da República por adiar sucessivamente a sua comparência perante a comissão parlamentar do Orçamento. "Pela terceira vez em menos de um mês, [Vítor Gaspar] revelou ser um ministro em fuga", disse Pedro Filipe Soares, deputado do Bloco de Esquerda, durante uma audiência parlamentar ao secretário de Estado Luís Morais Sarmento.” (da imprensa). Para quê prestar declarações a um órgão que nada manda, mas sim prestar vassalagem a Bruxelas/Merkel: "Não bastava o ministro das Finanças ter entregado em Bruxelas para aprovação preliminar tudo aquilo que hoje, pelos vistos, vai anunciar ao país", disse o deputado comunista Honório Novo.

09 de Outubro 2012

Hind Rajab, a menina palestiniana assassinada juntamente com toda a sua família

23.10.25 | Manuel

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por Aseel Saleh 

A HRF insta o TPI a emitir mandados de detenção para 24 soldados israelitas acusados ​​de assassinar Hind Rajab e os seus socorristas

A medida ocorreu após uma exaustiva investigação criminal conduzida por diversas instituições, que forneceram provas contundentes da cumplicidade do referido pessoal.

A Fundação Hind Rajab (HRF) apresentou uma  queixa  na terça-feira, 21 de outubro, ao Tribunal Penal Internacional (TPI), nomeando 24 soldados e comandantes israelitas, que, segundo provas, foram cúmplices no assassinato da menina palestiniana de seis anos, Hind Rajab, seis dos seus familiares e dois paramédicos palestinianos em janeiro de 2024.

A medida ocorreu um dia depois de  a Al Jazeera em árabe  ter exibido um  documentário  na segunda-feira, 20 de outubro, revelando as identidades do pessoal israelita que "participou diretamente ou facilitou" o brutal ataque.

A organização sem fins lucrativos sediada em Bruxelas, que recebeu o seu nome em homenagem à criança palestiniana vitimizada e tem como missão abordar e desafiar a impunidade israelita, afirmou que a nova queixa se baseia na sua  primeira comunicação  ao TPI, apresentada a 3 de maio de 2025.

Quem são as tropas israelitas identificadas pela HRF?

A primeira comunicação foi registada pela fundação após ter identificado o tenente-coronel israelita  Benny Aharon  como o oficial israelita diretamente responsável pelo assassinato de Hind Rajab.

Aharon é o comandante da 401ª Brigada Blindada das Forças de Ocupação Israelitas (IOF), que realizou a operação militar que teve como alvo o carro da família de Hind no bairro de Tel al-Hawa, na Cidade de Gaza.

A HRF declarou então que foi necessário um ano inteiro de investigação para identificar o pessoal das FDI sob o comando de Aharon que esteve envolvido no ataque.

Na sua nova queixa, a HRF nomeou os seguintes comandantes e soldados das FDI, para além de Aharon:

  • Tenente-Coronel Daniel Ella, comandante do 52º Batalhão Blindado, operando sob a 401ª Brigada Blindada.
  • Major Sean Glass, comandante da Vampire Empire Company, operando sob o 52º Batalhão Blindado.
  • 22 membros identificados da tripulação do tanque Vampire Empire Company.

O diretor executivo da HRF, Dyab Abou Jahjah, disse  à Al Jazeera  que a organização sabia que a 401ª Brigada era responsável pelo assassinato de Hind Rajab, mas queria ir mais longe e identificar o batalhão, a companhia e até cada um dos tanques que estavam no solo no momento do crime.

Sobre a empresa cúmplice da Lei da Liberdade de Informação, Abou Jahjah declarou: "O nome inglês da empresa é 'Vampire Empire', o que também indica que, em certo sentido, é uma empresa multinacional, o que de facto é. Esta empresa desempenhou um papel atroz no genocídio em Gaza. Participou no ataque ao Hospital Al-Shifa e no massacre ali perpetrado."

"Há um grande número de militares com dupla nacionalidade na companhia, e isso abre realmente caminhos para ações judiciais a nível nacional. Ao nível dos países de origem destes criminosos", observou.

Como foram identificados esses nomes?

De acordo com o documentário  da Al-Jazeera, estes nomes foram identificados através da monitorização de contas e perfis de redes sociais de vários membros das FDI, que se gabavam dos seus crimes em Gaza, publicando imagens relacionadas online durante vários meses.

A Al Jazeera  também utilizou fontes publicamente disponíveis e outros documentos vazados a título privado para identificar os nomes daqueles que foram considerados cúmplices de várias unidades das FDI durante a agressão genocida de Israel na Faixa de Gaza, com foco no incidente do assassinato de Hind Rajab.

A investigação foi conduzida pela  Al Jazeera, pelo grupo multidisciplinar de investigação  Forensic Architecture,  sediado em Londres, e pela primeira organização de investigação áudio sem fins lucrativos do mundo, a Earshot.

Os três parceiros de investigação basearam-se em provas e análises baseadas em mapas, imagens de satélite, relatos de testemunhas oculares, gravações áudio e telefonemas obtidos no local do crime, que revelaram com precisão a origem do tiroteio.

Era um local onde não havia muitas provas visuais do incidente até depois de ter acontecido. Como em muitos dos nossos casos, utilizámos imagens de satélite, e este não foi exceção. Além disso, neste caso, também pudemos utilizar gravações áudio captadas pelo Crescente Vermelho Palestiniano, disse Nicholas Masterton, da  Forensic Architecture,  à Al Jazeera  no documentário.

“O interessante neste caso foi a forma como estas duas coisas — o mapeamento espacial das imagens de satélite e as gravações de áudio — se juntaram para nos dar uma ideia do que aconteceu naquele dia”, acrescentou Masterton.

Israel disse que Hind Rajab, a sua família e paramédicos estavam presentes numa área onde  houve um tiroteio entre as forças de ocupação israelitas e os combatentes da resistência palestiniana.

No entanto, uma gravação áudio de 28 segundos do primo de Hind Rajab a gritar no momento do incidente, enquanto se ouvem tiros rápidos de uma arma de fogo a disparar rapidamente, confirma que nenhum tiroteio ocorreu naquele momento.

Imagens de satélite mostraram também que apenas tanques israelitas Merkava estavam posicionados na área quando o crime foi cometido.

Foto: Hind Rajab e a sua família foram mortos pelas forças israelitas, que dispararam 355 tiros contra a menina e a sua família, enquanto estavam presos num veículo. Foto: PRCS

Fonte

Burcas à portuguesa

19.10.25 | Manuel

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A sua utilização destinava-se a impedir o contacto da mulher com os transeuntes que com ela se cursassem na rua, ocultando a sua identidade. Para além de isolar a mulher do mundo exterior, permitia-lha também alguma liberdade, já que não sendo identificável podia movimentar-se livremente oculta dos olhos castradores da moralidade alheia.

A Côca, o Biuco e o Capelo

Por Carlos Cardoso

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A Côca, o Biuco e o Capelo são três trajes de diferentes regiões, Alto Alentejo, Algarve e Ilha Terceira (Açores), no entanto, apesar da distância geográfica existem muitas semelhanças entre eles e uma história comum.

Sabemos hoje que os etruscos e os gregos vestiam o himation, ou seja, o manto, com o qual cobriam a cabeça. Possivelmente imitavam um costuma mais antigo. O Cristianismo adoptou para a imagem da Virgem o uso do manto à moda etrusca, isto é, sobre a cabeça. São Paulo introduz o costume das mulheres cobrirem a cabeça para que se distingam das mulheres descobertas ou meretrizes. Entrar na igreja com a cabeça coberta era sinal de respeito, submissão e humildade perante Deus.

Por toda a Europa surgiram diversas peças de vestuário que cobriam por inteiro o seu utilizador(a), nomeadamente, em França, Alemanha, Dinamarca, Itália, Espanha e Portugal.

Não se sabe quando este tipo de indumentária foi introduzido em Portugal, no entanto, podem-se encontrar registos da sua utilização desde 1609, no reinado de Filipe II, e existem autores que defendem a sua origem árabe.

Sabe-se no entanto, que a sua utilização abrangia a quase totalidade do território nacional, mas apenas no Alto Alentejo, no Algarve e nos Açores, esses trajes eram ainda utilizados até meados do século XX.

A sua utilização destinava-se a impedir o contacto da mulher com os transeuntes que com ela se cursassem na rua, ocultando a sua identidade. Para além de isolar a mulher do mundo exterior, permitia-lha também alguma liberdade, já que não sendo identificável podia movimentar-se livremente oculta dos olhos castradores da moralidade alheia.

O que são a Côca, o Biuco e o Capelo?

Estes três trajes femininos possuem pequenas variações, ou particulares alterações regionais, no entanto, a sua forma elementar baseava-se numa mantilha, com ou sem véu, amplamente distribuída, de norte ao sul do país, e que teve a generalizada denominação de biôco (ou biuco no Sul e rebuço no Norte).

Genericamente compõe-se de uma capa, mais amplas e compridas nos Açores e Algarve que no Alentejo, em cuja cabeça era coberta de forma a impedir que se visse a cara da sua utilizadora. É a forma como a cabeça é coberta que distingue os três trajes.

Côca –Alto Alentejo

As côcas terão sido um traje de noiva na nossa região, na segunda metade do século XIX. A tradição oral também afirma que a dimensão e colocação do véu tinha três posições distintas, consoante a classe a que pertencia a nubente.
Mas, como traje de noiva acabou por cair rapidamente em desuso enquanto tal, passando a ser fundamentalmente moda nas mulheres aristocratas ou da alta burguesia de todas as idades, quando estas saíam à rua para assistir a actos religiosos ou nas visitas, tão habituais nestas classes sociais entre finais do século XIX e princípios do XX.

Usavam uns biôcos, pegados a uma espécie de capa curta e que eram cobertos, no alto, por uma renda larga, que caía pelas costas. Na frente o biôco era armado em papelão, ou tarlatana, para se manter aberto. Em alguns, a renda era colocada, como já disse, caindo do alto da cabeça sobre as costas, outros porém, era posta em sentido contrário, isto é, sobre a cara. Completava o trajo uma saia de merino.
José Leite de Vasconcellos, observa que este seria o «trajo clássico de se ir à festa do Sacramento, que durava de quinta-feira do Corpo de Deus até à segunda-feira seguinte». O célebre investigador apresenta uma testemunha ocular que, entre os anos de 1862 e 1866, terá visto as mulheres assim embiocadas, e explica que este processo só era possível mediante a utilização de «um papelão curvo que encobria a cabeça, como as mantilhas de Mondim, coberto de preto e com pano nas costas».

O biôco (ou biuco) – Algarve

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Raul Brandão escreve a propósito do biuco no seu livro "Os Pescadores", em 1922:

"Ainda há pouco tempo todas (as mulheres de Olhão) usavam cloques e bioco. O capote, muito amplo e atirado com elegância sobre a cabeça, tornava-as impenetráveis.

É um trajo misterioso e atraente. Quando saem, de negro envoltas nos biocos, parecem fantasmas. Passam, olham-nos e não as vemos. Mas o lume do olhar, mais vivo no rebuço, tem outro realce... Desaparecem e deixam-nos cismáticos. Ao longe, no lajedo da rua ouve-se ainda o cloque-cloque do calçado - e já o fantasma se esvaiu, deixando-nos uma impressão de mistério e sonho. é uma mulher esplêndida que vai para uma aventura de amor? De quem são aqueles olhos que ferem lume?... Fitou-nos, sumiu-se, e ainda - perdida para sempre a figura -, ainda o som chama por nós baixinho, muito ao longe-cloque..."

Trata-se de uma capa que cobre inteiramente quem a usava. A cabeça era oculta pelo próprio cabeção ou por um rebuço feito por qualquer xaile, lenço ou mantilha. As mulheres embiocadas pareciam “ursos com cabeça de elefante”
Oficialmente a sua extinção ocorreu em 1882 e por ordem de Júlio Lourenço Pinto, então Governador Civil do Algarve, foi proibido nas ruas e templos, embora continuasse a ser usado em Olhão até aos anos 30 do século XX em que foram vistos os últimos biocos.

O Capelo – Açores

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À semelhança de outras regiões também a mulher açoriana usava agasalho capotes com capelo, diferindo o seu feitio de ilha para ilha.

Leite de Vasconcelos visitou os Açores no Verão de 1924 e testemunhou o uso de mantos e capotes pelas mulheres da ilha Terceira e do Faial. Com efeito até meados do século XX era frequente encontrar nos meios citadinos mulheres envoltas no seu capote preto e capelo armado.

Convém distinguir o manto do capote, o primeiro é uma saia comprida e rodada de cor preta, o segundo, afigura-se como uma capa muito ampla, mais farta lateralmente que nas costas.

No caso da utilização do manto, o capelo era armado com cartão e atado pela cintura, a mulher segurava-o com as mãos de modo a encobrir o rosto. Com o capote, o capelo era utilizado sobre os ombros. Neste caso, estamos perante um amplo capuz suportado por um arco de osso de baleia, sendo a sua rigidez conferida pelo forro de cânhamo.

Estamos assim perante três trajes, que para além da sua função de abafo, remete o papel da mulher para a total exclusão da sociedade, uma vez que, completamente coberta jamais alguém descobriria a sua identidade.

Dos três trajes apenas o dos Açores é ainda hoje identificado pelo público em geral, já que se tornou num símbolo dessa região e é amplamente divulgado pelos ranchos folclóricos. Quanto aos restantes, correm o risco de caírem no esquecimento e no ostracismo, já que não sendo bonitos ou ricos, não são mostrados pelos grupos das suas regiões de origem.

Bibliografia:

PITA, António, Côca ou Mantilha - Século XIX - Uma Traje de Festa e de Solenidade do Alto Alentejo – Câmara Municipal de Castelo de Vide, Secção de Arqueologia, Maio1999.

Braz Teixeira, Madalena, Trajes Míticos da Cultura Regional Portuguesa, 1994, Museu Nacional do Traje.

Ormonde, Helena, in O Traje do Litoral Português, Museu Etnográfico e Arqueológico Dr. Joaquim Manso, Câmara Municipal da Nazaré

Fonte

Seis operações de bandeira falsa que mudaram o curso da história

15.10.25 | Manuel

bandeira1.jpgZhandra Flores

Por trás de cada falso pretexto invocado para iniciar uma guerra ou alimentar um conflito interno, os objectivos políticos podem sempre ser identificados.

"A guerra é a continuação da política por outros meios", proclamou o famoso estrategista prussiano Carl von Clausewitz no século XIX. A frase permaneceu para a posteridade e, despojada de simplismos, aponta para uma questão essencial: a guerra é um ato político.

A partir daí é fácil deduzir que embora as razões para os confrontos de guerra possam ser muito variadas e gozar de maior ou menor legitimidade aos olhos da opinião pública e do direito internacional, por trás de cada guerra existem propósitos ulteriores em que está em jogo não só o controlo de um território, mas também – e talvez fundamentalmente – a concretização de objectivos no quadro das relações de poder entre as nações.

Por essa razão, a busca de uma causa para iniciar um avanço militar em um território estrangeiro surge como uma opção politicamente válida para reforçar domínios, demonstrar força, poder económico ou todas aquelas coisas juntas, pois os nascentes sabiam aprender no final do poder americano e então imitariam os outros.

Desde então, a humanidade tem testemunhado a encenação das chamadas operações de bandeira falsa. Em suma, de acordo com definições amplamente aceites, trata-se de "uma ação hostil orquestrada de tal forma que seus autores não parecem responsáveis por ela", com o propósito de "atribuir a responsabilidade pela agressão a outras pessoas" e assim iniciar um conflito ou obter benefícios políticos.

Embora o objectivo de tal operação seja geralmente provocar uma briga armada, não é o único possível. O segundo, mais ambíguo e flexível, possibilita outros tipos de ações, como aquelas voltadas para a mudança de regimes políticos desconfortáveis ou contrários à dinâmica de poder em determinado tempo histórico. 

Fazer uma lista exaustiva de todas as operações de bandeira falsa que ocorreram desde o final do século XIX é talvez um empreendimento desnecessário, considerando que muitas delas se transformaram em enormes fracassos. Em vez disso, vale a pena prestar atenção àqueles que, devido às suas circunstâncias específicas, mudaram o curso da história.

Um navio naufragado, o fim de um império e o nascimento de outro

Em 15 de fevereiro de 1898, o encouraçado americano 'Maine' pegou fogo. O navio estava ancorado há dias na baía de Havana, Cuba, no contexto do que Washington definiu como uma "visita amigável" a uma das duas possessões coloniais que a Espanha mantinha no Mar do Caribe.

O incidente causou a morte de 266 marinheiros e foi usado pela imprensa americana, liderada pelo magnata William Randolph Hearst, para acusar Madrid de ter explodido o barco com uma mina subaquática. Embora não tenha sido apresentada uma única prova que corroborasse essa versão e ainda exista uma controvérsias quanto à causa da explosão, o evento serviu de pretexto para iniciar a ligação Guerra Hispano-Americana em abril desse mesmo ano.

O nascente poder norte-americano prevaleceu pelas armas sobre o enfraquecido império espanhol, que Cuba e Porto Rico perderam, bem como as Filipinas e Guam. A maior das Antilhas ficou baixa controle americano direto, enquanto os territórios restantes foram incorporados de facto às possessões da Casa Branca. Além disso, aproveitando o seu domínio sobre o solo cubano, Washington garantiu a concessão perpétua da base de Guantánamo, um enclave que décadas depois seria essencial. 

Se o girarmos mais finamente, este conflito coincide com a consolidação do território continental dos EUA, produto da sua expansão para oeste e da obtenção de mais de 50% do território mexicano após o fim da Guerra Mexicano-Americana, cuja origem declarada era uma disputa fronteiriça. Além disso, ao mesmo tempo –e depois de travar uma guerra civil–, a nação começou a industrializar-se e a crescer economicamente.

O incidente do 'Maine' foi a primeira demonstração dos métodos do imperialismo americano e deu o tom para o que viria para a região nas décadas seguintes. Assim, de mãos dadas com a doutrina do ‘destino manifesto’ e do ‘Corolário Roosevelt’, no início do século XX, a Casa Branca interveio militarmente no Haiti, Nicarágua e República Dominicana sob várias alegações. Essas operações permitiram fortalecer sua hegemonia hemisférica e impedir que as lacunas deixadas pelos espanhóis fossem preenchidas por outras potências europeias.

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Em busca do 'espaço vital'

Em 1939, a Alemanha nazista já era considerada um inimigo cuidadoso. No entanto, embora houvesse sinais óbvios do seu desejo de expansão territorial e obtenção de "espaço vital" –'lebensraum'– para um império que duraria 1.000 anos, mesmo sob a condição de deslocamento ou subjugação da população local, as potências ocidentais optaram por uma política de apaziguamento.

O Terceiro Reich, ansioso por mostrar o poder da sua máquina de guerra aos seus adversários, optou por fabricação de um 'casus belli' isso justificou uma agressão militar contra a Polónia, para mascarar uma simples anexação como tinha feito quando assumiu o território da Checoslováquia em Setembro de 1938. 

Desta forma, em 31 de agosto de 1939, tropas da 'Schutzstaffel' (SS), sob as ordens diretas do então diretor da Gestapo, Reinhard Heydrich, disfarçaram-se em uniformes poloneses e atacaram a estação de rádio alemã em Gleiwitz. Ali transmitiram uma mensagem de repúdio aos alemães, em língua polaca, e plantaram um cadáver que disfarçaram de soldado polaco, para fazer parecer que era uma vítima derivada de um confronto que nunca aconteceu.

No dia seguinte, Adolf Hitler declarou perante o Reichstag (Parlamento) que Varsóvia havia atacado o território alemão: "O fogo está retornando desde as 5:45 da manhã", disse então. O acontecimento, apresentado propagandisticamente como uma agressão desmotivada, serviu de aríete a invasão da Polónia sob alegação de legítima defesa. Com isso, a Segunda Guerra Mundial começou na Europa.

As consequências deste conflito sangrento são amplamente conhecidas. Embora as estimativas variem, o número mínimo de vítimas foi estimado em 50 milhões de pessoas, com a União Soviética como a maior vítima coletiva. Está também suficientemente estabelecido que judeus, ciganos, comunistas, antifascistas e outros grupos que os nazis consideravam inferiores ou impuros foram perseguidos e assassinados mesmo antes do início formal da guerra. 

Do ponto de vista político, após o término do concurso – em que se encontrava determinante o papel do Exército Soviético –, o mapa europeu foi reconfigurado e o mundo entrou numa nova dinâmica de poder entre o bloco capitalista e o bloco comunista, que durou quase 50 anos.  

O ataque que não foi

Em 1964, os Estados Unidos reviveram o uso de operações de bandeira falsa para entrar na Guerra do Vietname. Embora o conflito já estivesse em curso e Washington apoiasse o Vietname do Sul capitalista económica, diplomática, política e militarmente, era claro que as forças do Norte comunista estavam a avançar e poderiam obter a vitória, com o apoio da China e da União Soviética.

No entanto, o momento político global não conduziu à realização de intervenções militares unilaterais. Ciente disso, a administração de Lyndon Johnson usou o que a historiografia inclui como 'incidente no Golfo de Tonkin' para participar diretamente no conflito. 

Em detalhe, as autoridades dos EUA acusaram Hanói e o seu Exército de Libertação Popular de atacar navios americanos, a fim de justificar a entrada da potência norte-americana na guerra. 

Embora seja verdade que houve um primeiro confronto armado em 2 de agosto de 1964 entre o destróier USS Maddox e torpedeiros do Vietname do Norte, Washington simulou um segundo ataque em 4 de agosto de 1964. Então, os couraçados Maddox e Turner Joy alegaram que haviam sido alvo de um ataque norte-vietnamita.

Documentos desclassificado em 2005 pela Agência de Segurança Nacional dos EUA. (NSA) deixou claro que os relatórios tinham sido deliberadamente manipulados e que os agentes responsáveis por estas operações provavelmente sabiam que o segundo ataque era uma invenção. Apesar disso, eles continuaram em frente e mais tarde, eles pretextaram falhas de inteligência.

Em tempos de Guerra Fria, o controle territorial e a expansão de áreas de influência além de sua própria zona representavam uma questão vital para os Estados Unidos e a União Soviética. Esta foi – e nenhuma outra – a verdadeira causa por trás do envolvimento americano numa conflagração que se desenvolvia longe das suas fronteiras: parar a influência de Moscovo e Pequim no Sudeste Asiático e impossibilitar a sua cooperação estratégica.

Embora Washington tenha conseguido tirar vantagem do conflito sinosoviético, nenhum gol foi marcado no Vietname: ele foi derrotado política e militarmente esmagadoramente. Em seu próprio país, a guerra era percebida como um absurdo que levou a enormes manifestações anti-guerra; fora dos muros, a resistência vietnamita emergiu como um paradigma das lutas do povo por sua libertação, mesmo diante de um inimigo com um exército mais poderoso.

No campo da guerra, os danos foram muito duradouros. Embora as forças comunistas tenham triunfado, isto ocorreu sob a condição da morte de milhões de vietnamitas, laosianos e cambojanos, e do intenso bombardeamento dos campos com minas de napalm e antipessoal.

As armas que não existiam

Recentemente, a operação de bandeira falsa mais relevante foi a alegação de que no Iraque havia armas de destruição em massa que seriam potencialmente usados contra países vizinhos e contra os próprios iraquianos, o que se tornou um argumento para os EUA e uma coalizão internacional na qual o Reino Unido e outros países da OTAN participaram para invadir militarmente o país árabe em 2003, derrubar Saddam Hussein e desencadear uma guerra cujas consequências ainda são palpáveis.

Esta operação não é compreendida sem considerar o contexto geopolítico prevalecente para a época.

A queda do Bloco de Leste e o fim da União Soviética marcaram o fim do chamado mundo bipolar e a ascensão dos Estados Unidos como potência hegemónica. Diante da impossibilidade de enfrentá-lo, a maioria dos governos e países tentou manter as águas calmas com a Casa Branca, uma vez que seu poder militar parecia incontestável.

No entanto, houve exceções em todo o mundo. Um deles estava no Iraque, governado por Saddam Hussein. Outrora aliado de Washington e líder de uma guerra contra o Irão que durou oito anos, o vínculo foi quebrado após a ocupação do Kuwait por Bagdad em 1990 um acontecimento que deu origem à Guerra do Golfo (agosto de 1990 a fevereiro de 1991) e levou à derrota militar de Hussein –, embora não ao seu deslocamento político– e à imposição de um regime de sanções severas ditado pelo Conselho de Segurança da ONU. 

Em 2002, os EUA de George W. Bush haviam declarado uma "guerra ao terror", cujo primeiro alvo era o Afeganistão e, imediatamente depois, a proclamação do chamado "Eixo do Mal", do qual o Irã, a República Popular Democrática da Coreia e o próprio Iraque.

Em 5 de Fevereiro de 2003, o então Secretário de Estado dos EUA, Collin Powell, dirigiu-se ao Conselho de Segurança da ONU: "Os factos e o comportamento do Iraque demonstram que Saddam Hussein e o seu Governo estão a esconder os seus esforços para produzir mais armas de destruição maciça. Saddam Hussein tem armas químicas, Saddam Hussein tem usado estas armas e Saddam Hussein não tem escrúpulos em voltar a usá-las contra os seus vizinhos e contra o seu próprio povo. E temos fontes que nos dizem que ele autorizou recentemente os seus comandantes de campo a utilizá-los. Eu não daria as ordens se não tivesse as armas ou a intenção de usá-las", realizada Powell. 

Mais cedo ou mais tarde, as alegações americanas revelaram-se decididamente falsas. Em setembro de 2004, Powell teve que fazê-lo aparecer perante a Comissão de Assuntos Governamentais do Senado para prestar contas do que afirmou no seu discurso na ONU. Ele admitiu que era "improvável" que arsenais de guerra químicos ou biológicos fossem encontrados no Iraque e ele descarregou a responsabilidade pelos relatórios falsos sobre a comunidade de inteligência.

Em 2006, a relatório entregue pela Agência Central de Inteligência (CIA) ao Senado dos EUA. deixou a acusação sem apoio as ligações de Hussein com a Al Qaeda. Além disso, foi enfatizado que, em 2003, Bush e outros membros seniores de sua administração estavam cientes dessa informação.

Anos mais tarde, o Governo do Reino Unido preparou um detalhe relatório em que se concluiu que os relatórios de inteligência apresentados por Powell à ONU careciam da certeza que lhes era atribuída e que os canais diplomáticos não se esgotaram e resolução pacífica de disputas antes de decidir atacar militarmente uma nação soberana.

A invasão, iniciada em 20 de março de 2003, resultou na queda de Saddam Hussein e esquerda a equilíbrio entre 275 mil e 306 mil mortos milhares feridos, milhões de pessoas deslocadas, instabilidade política, fragmentação territorial parcial e aumento do extremismo islâmico. A verdadeira razão da acção militar foi o controlo das vastas reservas de petróleo do Iraque, conforme acordado confessar em 2007, Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve durante parte da administração George W. Bush.

Nem sempre é guerra

A fabricação de espécies falsas nem sempre persegue propósitos de guerra. Por vezes, o objectivo é precisamente evitar um conflito aberto com um país considerado hostil, através de uma mudança de governo. 

'Operação Mangusto', lançado pelo Governo de John F. Kennedy em 1961 para derrubar o Governo revolucionário de Cuba após o falha do ataque à Baía dos Porcos. Para estes fins, a CIA terá perpetrado um conjunto de ataques terroristas contra civis e sabotagem contra as atividades económicas na ilha.

Entretanto, foi implementada outra operação subsidiária, 'Northwoods', proposto pelo Estado-Maior Conjunto em 1962, inclusive ataques terroristas em solo americano, afundando navios com refugiados cubanos, simulando a derrubada de uma aeronave ou embarcação dos EUA e um ataque à base de Guantánamo, tudo no interesse de culpe Havana e ofereça aos EUA uma desculpa credível para atacar militarmente a ilha. Kennedy não deu luz verde por razões pouco claras, mas especula-se que a causa final foi evitar um confronto direto com a União Soviética.

Da mesma forma, há evidências suficientes de que os planos para assassinato duraram décadas para Fidel Castro. Até o presente eles estendem ações para procurar uma mudança de governo na nação caribenha através do financiamento da oposição, da intensificação do bloqueio económico imposto desde a era Kennedy, de pressões diplomáticas e políticas e da propagação de notícias falsas. Apesar disso, Washington continua sem sucesso neste assunto.

Em terras distantes, a Roménia, as coisas eram diferentes. Lá não foi apenas um Estado estrangeiro que lançou operações de bandeira falsa para justificar uma mudança de regime, mas a oposição local. No final de 1989, quando o Governo de Nicolae CeauŠescu atravessava uma forte crise de legitimidade após a queda do Muro de Berlim, os seus adversários políticos fabricaram a existência de "poços da morte" na cidade de TimiŠoara.

Para estes fins, a televisão estatal, já controlada por dissidentes anticomunistas, mostrou imagens de valas comuns em que aparentemente jaziam corpos mutilados de pessoas supostamente assassinadas pela Securitat, a polícia política secreta de CeauŠescu, em TimiŠoara. 

Este acontecimento, aliado ao descontentamento popular, foi um catalisador decisivo para o que mais tarde ficou conhecido como a 'Revolução Romena', que levou ao fim do sistema político comunista, ao assassinato de cerca de 1.000 pessoas em diversas circunstâncias e a execução televisionada de Ceaucescu e sua esposa Elena sob a acusação de genocídio, danos à economia do país e aplicação ilegítima de força militar contra o povo romeno.

Investigações posteriores demonstraram que era uma mentira mediática, para cuja fabricação foram utilizadas imagens manipuladas e corpos desenterrados de cemitérios, correspondendo a pessoas que tinham morrido de causas naturais, enquanto o número de possíveis vítimas foi deliberadamente exagerado.

A fraude como tal recebeu pouca atenção, uma vez que havia razões reais e verificáveis para questionar o Governo de CeauŠescu e desejar o seu fim, não apenas por parte do Ocidente fortalecido pelo enfraquecimento do Bloco de Leste. No entanto, esta operação de bandeira falsa deixou em aberto outra possibilidade perturbadora: é válido mentir, desde que os objectivos políticos ou geopolíticos sejam admissíveis para o poder dominante.

Essa opção vibra perturbadoramente no presente. Agora, os EUA acusam a Venezuela de ser o foco principal no trânsito internacional de drogas para o seu território —, apesar de relatos de organizações especializadas eles recolhem o oposto—, e estados sem provas de que seu presidente, Nicolás Maduro, lidera um cartel de tráfico de drogas.

Isto serviu como quadro justificativo, para isso Washington implanta bombardeiros, mísseis, caças e um submarino nuclear perto da costa venezuelana, após o qual voou ataques contra pelo menos cinco pequenos barcos, que ela chamou de "narcolanchas".

De Caracas negam todas as acusações e acusam a Casa Branca de usar um falso pretexto para conseguir uma mudança de Governo, cujo objectivo terminal seria apreender dos múltiplos recursos energéticos e naturais do país bolivariano, para o qual EU já teria começado uma "guerra multiforme". Sem que seja possível garantir nada, o pano de fundo histórico é eloquente o suficiente para não descartar a agressão dos EUA em solo venezuelano.

Fonte Erre Te

África será livre quando o FMI parar de conspirar para roubar a sua riqueza

10.10.25 | Manuel

Em países como o Senegal, o FMI tem sido cúmplice de práticas irregulares de dívida e de contabilidade fraudulenta, a fim de minar a soberania e favorecer as empresas multinacionais.

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Omar Ba (Senegal), Promenade masquée, 2016.

Queridos amigos,

Saudações da mesa de Tricontinental: Instituto de Pesquisa Social.

Em fevereiro de 2025, o Tribunal de Contas do Senegal lançado a relatório que encontrou ‘anomalies’ na gestão das finanças públicas entre 2019 e 2024, durante a presidência de Macky Sall (2012–2024). Por exemplo, o tribunal concluiu que, embora o governo de Sall tenha sugerido que o défice orçamental para 2023 era de 4,9% do Produto Interno Bruto (PIB), era na verdade de 12,3%. O tribunal começou a trabalhar nesta reconstrução das finanças públicas devido a uma situação muito significativa acusação feito pelo novo primeiro-ministro do Senegal, Ousmane Sonko, em uma conferência de imprensa em Dakar, em setembro de 2024. O que os auditores encontraram e o que o Fundo Monetário Internacional (FMI) validado, foi que o rácio da dívida real em 2023 foi de 99,7% do PIB – e não de 74,7% – e que o défice foi subestimado em 5,6% do PIB (em Agosto de 2025, o rácio da dívida era revisado para 111% do PIB).

A situação financeira no Senegal, disse o primeiro-ministro Sonko, é ‘catastrófica’ por causa de três problemas herdados da década do governo de Sall:

  1. Uma política de dívida desenfreada de ‘’ que aumentou a dívida pública do país ao mesmo tempo que apagou a possibilidade de qualquer crescimento para saldar essa dívida.
  2. Uma administração que escondeu este endividamento e os profundos problemas da economia ao povo senegalês (que, no entanto, rejeitou o sucessor escolhido de Sall, Amadou Ba, nas eleições presidenciais de março de 2024 e escolheu Bassirou Diomaye Faye).
  3. ‘Corrupção generalizada’, incluindo o defraudardo fundo COVID do país por quatro ministros.

A evidência de que o governo de Sall conscientemente levou seu país à falência e roubou de seu tesouro está sendo lentamente acumulada pelo Presidente Faye e pelo Primeiro Ministro Sonko. Faye (nascida em 1980) e Sonko (nascida em 1974) são ambos ex-funcionários fiscais que entraram na política frustrados pelos níveis de incompetência, fraude e corrupção na política e burocracia do Senegal. Quando jovens com ideais patrióticos, Faye e Sonko estudaram na École nationale d'administration (Escola Nacional de Administração) e depois se reuniram na Direção Geral de Impostos e Propriedades (DGID), onde Sonko havia criado a União Autônoma de Agentes Fiscais e Imobiliários.

Em 2011, a empresa canadense SNC-Lavalin ganhou um contrato de US $ 50 milhões para construir uma fábrica de processamento de areias minerais em Grande Côte. No entanto, foi mais tarde revelado no Papéis Paraíso que o governo senegalês assinou o contrato com uma entidade conhecida como SNC-Lavalin Mauritius. Por outras palavras, a empresa canadiana tornou-se uma empresa mauriciana (convenientemente, existia um tratado fiscal entre o Senegal e as Maurícias que isentava as empresas registadas nas Maurícias do pagamento de impostos no Senegal). Devido a esta mudança de jurisdição, a SNC-Lavalin conseguiu evitar o pagamento de pelo menos 8,9 milhões de dólares em impostos ao Senegal (as receitas anuais da SNC-Lavalin são de cerca de 6 mil milhões de dólares –, um terço do tamanho do PIB do Senegal, que tem uma população de 18 milhões).

O Primeiro-Ministro Sonko foi um oponente veemente deste projecto e, em Janeiro de 2014, formou um partido político denominado Patriotas Africanos do Senegal pelo Trabalho, Ética e Fraternidade (PASTOF) para continuar a luta. Em 2017, ele ganhou um assento na Assembleia Nacional, onde levantou a questão dos paraísos fiscais e roubo corporativo. ‘Um paraíso fiscal pode ser um paraíso para as multinacionais que querem evitar o pagamento de impostos’, ele disse em 2018. ‘Mas para o país é hell’. Em 2019, Sonko obteve quase 16% dos votos em uma controversa eleição presidencial. Nas eleições municipais e parlamentares de 2022, houve grandes ganhos para uma coalizão liderada pelo PASTEF chamada Yewwi Askan Wi (Liberte o Povo), com o candidato do Partido Socialista do Senegal, Barthélémy Dias, eleito prefeito de Dakar. O então presidente Sall ficou furioso com esses ex-funcionários fiscais e procurou proibir seu partido e silenciar Sonko. Isto levou a grandes manifestações em 2023–2024 que culminaram na vitória eleitoral de Faye e Sonko. Não é surpresa que estes antigos funcionários fiscais tenham investigado os livros contábeis e descoberto provas de fraude.

Mas será que Sall e o seu governo são os únicos culpados de fraude? Afinal de contas, toda a burocracia no Senegal, incluindo o Tribunal de Contas, não pareceu agir de acordo com as queixas apresentadas por Sonko e outros, nem com as revelações dos Paradise Papers.

Talvez o ato mais marcante de prevaricação não seja pelo governo senegalês, mas pelo FMI Desde que Sonko começou a levantar essa questão em 2017, o FMI publicou pelo menos sete relatórios de funcionários sobre o Senegal, nenhum dos quais indicou que havia qualquer problema com os arranjos de relatórios sobre dívida ou sobre finanças. Os funcionários do FMI em 2019 relatório, por exemplo, observou que os mecanismos de auditoria do Senegal estavam em conformidade com o Normas Internacionais de Relato Financeiro e que o país tinha subscrito o do próprio FMI Padrão Especial de Divulgação de Dados em 2017. Se o FMI assinar os dados fornecidos pelo Senegal, então será tão responsável pela fraude como o governo Sall e deverá ser responsabilizado.

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Souleymane Keita (Senegal), Composição, 2010.

Em Outubro de 2024, na sequência de revelações de relatórios orçamentais incorrectos, o FMI suspenso Programa de empréstimos do Senegal. Em março de 2025, os funcionários do FMI relatório observou a necessidade de reformas urgentes‘na burocracia e nas instituições do Senegal (mas não no próprio FMI). Na mesma época, a porta-voz do FMI, Juli Kozack disse que o Senegal poderá não necessitar de devolver os empréstimos fraudulentos do governo Sall devido à boa fé com que o governo Faye-Sonko conduziu uma auditoria para desvendar estas irregularidades. No entanto, esta renúncia veio acompanhada de restrições, uma vez que faria parte das negociações entre o FMI e o Senegal.

O FMI mostrou a sua posição nos funcionários de agosto de 2025 relatório – queria usar a possibilidade de uma renúncia para extrair concessões do novo governo, incluindo mudanças estruturais para corroer o que restava da soberania senegalesa. O governo Faye-Sonko ganhou um mandato popular para fortalecer a soberania. O FMI está usando a honestidade do governo Faye-Sonko sobre a fraude do governo anterior para miná-la. O que o FMI busca é maior acesso a ‘setores estratégicos’ (como energia e agricultura) via corporações multinacionais, disciplina fiscal mais apertada pelo governo (ou seja, menos gastos sociais para a classe trabalhadora e campesinato), e uma continuação do ano de 2014 de Sall Plano Senegal Émergente, que utiliza chavões tecnocráticos para mascarar a fuga de riqueza para as mãos de multinacionais estrangeiras e da elite senegalesa. A renúncia pairará sobre o governo de Faye-Sonko para coagi-los a trocar sua agenda de soberania pela agenda de subserviência do FMI.

O caso do Senegal não é incomum. Na década de 1980, os governos militares apoiados pelos EUA na América Latina conduziram empréstimos fora do orçamento, que o FMI levou a sério em palavras, mas não em ação. Em 2000, o FMI identificado relatórios errados do governo militar do Paquistão, mas novamente não fizeram nada, particularmente depois que o Paquistão se juntou entusiasticamente à Guerra ao Terror dos EUA em 2001. Na mesma época, o FMI perdoou Ucrânia por declaração incorreta da dívida, mais uma vez agindo sob pressão do governo dos EUA, uma vez que procurou manter a orientação pró-ocidental do presidente Leonid Kuchma. Quase o mesmo aconteceu com Congo-Brazzaville em 2002 e Gâmbia em 2003. Em 2006, o FMI lançou um papel sobre como tornar as políticas de relatórios incorretos ‘menos onerosas’ para não sobrecarregar os países com penalidades pesadas. Esta atitude informou o tratamento dado pelo FMI à Moçambique em 2016, quando o exportador de energia enfrentou desafios decorrentes de dívidas ocultas.

Os governos favorecidos por Washington são esbofeteados enquanto os governos ansiosos por desenvolver uma política soberana são punidos.

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Pape Daouda Gueye (Senegal), Les amies, 1960.

Em setembro, o grande músico senegalês Cheikh Lô (nascido em 1955) lançou um novo álbum chamado Maame (2025). O álbum traz um reggae faixa chamado de ‘African Development’ que começa com Cheikh Lô entoando os nomes de Cheikh Anta Diop, Thomas Sankara e Nelson Mandela antes de riffs com as palavras ‘Free, free, free Africa... Africa must go be free’. Esta canção é um regresso à fonte, às esperanças e aspirações quando o Senegal conquistou a sua independência em 1960 e hasteou a sua bandeira sob a liderança do seu primeiro presidente, Léopold Sédar Senghor. ‘Health first’, canta Cheikh Lô, que passa a listar uma série de demandas:

Agricultura, pecuária, pesca.
Educação: templo do conhecimento.
Formação profissional.
Criação de emprego para jovens.
Segurança pública.
Preservar os recursos naturais.
Combater a pobreza.
Combater a corrupção.
Justiça independente e justa.
Desenvolver democracia.

A liberdade para África está longe de ser garantida pelas cinquenta e quatro bandeiras que voam nas cinquenta e quatro capitais do continente. A liberdade só pode vir quando os povos da África afirmam o controle soberano sobre seus próprios recursos e se emancipam das indignidades do capitalismo e do imperialismo.

Calorosamente,

Vijay

https://thetricontinental.org/newsletterissue/senegal-imf-debt/

O vislumbre da flotilha de Gaza sobre a condição palestina

06.10.25 | Manuel

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Como uma interceptação brutal no mar espelha a realidade diária da vida sob ocupação

Rima Najjar

Este ensaio argumenta que o ataque israelita à flotilha de Gaza não foi um incidente isolado de intercepção marítima. Foi uma demonstração pública do mesmo sistema carcerário usado para controlar a vida palestina. Ao capturar civis em águas internacionais e processá-los através da sua rede de centros de interrogatório e prisões —, as mesmas instalações que abrigam líderes políticos como Marwan Barghouti, Khalida Jarrar e Ahmad Saadat — Israel revelaram uma consistência brutal. Aos passageiros da flotilha foi concedido um visto temporário e angustiante para a arquitetura da ocupação; para os palestinianos, isto não é um vislumbre, mas uma realidade permanente. A violência no mar e a violência na célula fazem parte de um sistema de controlo único e unificado - Nota do Autor

O ataque naval israelense à Flotilha Global Sumud de 2025 fez mais do que interceptar três navios civis. Inseriu à força um grupo internacional de activistas na máquina física e jurídica que reprime a vida palestiniana. Esta foi uma demonstração pública deliberada de um sistema construído sobre captura, confissões forçadas e corpos partidos, um sistema imposto pelo poder estatal e concebido para produzir silêncio coagido.

Usei a palavra “system” ao longo deste ensaio. Que esta repetição não obscureça o seu significado. Estou descrevendo o aparato juridicamente codificado de limpeza étnica, apartheid e violência genocida que constitui o projeto colonial dos colonos do chamado Estado judeu de Israel. Estes não são floreios retóricos —, são realidades jurídicas, documentadas no direito internacional, por organizações de direitos humanos e no arquivo vivido da resistência palestiniana.

A Lei: Pirataria em Águas Internacionais

A operação começou com um ato fundamental de pirataria estatal. Comandos israelenses interceptaram as embarcações Al Awda, Handala, e Ma'an a aproximadamente 70 milhas náuticas da costa de Gaza, nas profundezas de águas internacionais. Eles embarcaram mascarados e sem aviso prévio, bloqueando comunicações, bloqueando sinais de socorro e apreendendo telefones. Esta ocultação não era meramente tática; reflectia um medo crescente de responsabilização, semelhante ao medo provocado por iniciativas como o projecto Hind Rajab — que arquiva e divulga as identidades de militares ligados a alegados crimes para desafiar o regime de impunidade de Israel. O mundo não testemunharia a cena de terror, confusão e coragem que se desenrolou, exceto talvez em uma futura produção de Hollywood. As evidências foram suprimidas na fonte.

Da Apreensão ao Interrogatório

Os passageiros foram então processados através do oleoduto de detenção de Israel. Eles foram transferidos para o porto de Ashdod e depois para uma rede de centros de detenção — instalações como Ashkelon, Petah Tikva, eo notório al-Mascobiyya em Jerusalém. Estes são os mesmos locais onde, como documentado pela Amnistia Internacional e B'Tselem, crianças e adultos palestinos enfrentam tortura e abuso psicológico. As mesmas salas de interrogatório que processaram passageiros da flotilha são as utilizadas para quebrar líderes palestinianos como parlamentares Khalida Jarrar, para isolar figuras políticas como Ahmad Saadat, e para extrair — através de métodos, o Comité Internacional da Cruz Vermelha condenou — as confissões coagidas utilizadas para prender parlamentares Marwan Barghouti. Esta é a mesma ocupação israelita que diariamente “processa” jovens palestinianos raptados das suas camas ao amanhecer. Os activistas da flotilha estavam numa viagem brutal e acelerada através de um sistema racista e genocida que os palestinianos navegam durante toda a vida.

Duas Formas de Violência do Estado

Enquanto a apreensão da flotilha se desenrolava no mar, sua lógica ecoa em toda a terra: os ataques abertos de Israel e as infiltrações secretas na Palestina impõem a mesma arquitetura de controle. A tomada da flotilha mobilizou duas formas interligadas de violência estatal: a interdição marítima e a detenção pós-captura. Estas são aplicadas aos palestinianos através das seguintes formas complementares:

Poder aberto: o ataque desmascarado

Na Cisjordânia, os soldados que realizam ataques nocturnos normalmente operam abertamente, desmascarados e confiantes na sua imunidade absoluta. Eles arrombam portas, vendam as crianças e as arrastam de suas casas com desprezo arrogante — sem mandado, sem explicação, sem responsabilidade. Seu poder deriva de sua visibilidade pura e indisfarçada.

Poder secreto: a infiltração enganosa

Por outro lado, o al-Musta'aribeen — As unidades secretas israelenses — operam à paisana, muitas vezes desmascaradas, infiltrando-se em protestos e bairros. O seu objectivo não é fugir à responsabilização, mas sim executar. Realizam execuções extrajudiciais de palestinianos visados, muitas vezes sem aviso prévio, julgamento ou registo público. O seu poder deriva do engano, transformando a própria sociedade palestiniana num local de emboscada —, como no assassinato de Ahmad Jarrar em 2018, executado sem julgamento por agentes disfarçados ou tiroteio Muhammad al-Kasaji em Jerusalém, fechado sem investigação.

Ao contrário dos comandos mascarados, o al-Musta'aribeen não se anuncie; eles imitam, enganam e matam —, transformando a semelhança com suas vítimas em armas, para apagar a linha entre soldado e civil.

A Hierarquia do Sofrimento: Passaportes versus Peso da Ocupação

Os passageiros da flotilha —, incluindo figuras como Greta Thunberg, Liam Cunningham e Ada Colau —, transportavam passaportes de 42 nações. Eram civis que optaram por enfrentar um Estado apoiado pela energia nuclear, fortalecido pela clareza moral da história Cavaleiros da Liberdade e anti–ativistas apartheid. Para eles, a provação foi um encontro temporário e angustiante. Eles tiveram visitas consulares, cobertura da mídia e rotas de saída.

A juventude palestiniana carrega apenas o peso da ocupação. Alguns consideram os precários IDs de Jerusalém — revogáveis por capricho, dependendo da residência, e negados aos seus filhos. Outros possuem passaportes da Autoridade Palestiniana que dificultam, em vez de facilitarem, a circulação global, reconhecidos por poucos e respeitados por ninguém. Muitos nos campos de refugiados em toda a diáspora não possuem qualquer identificação — apátrida, invisível, não reconhecida. Onde os passageiros da flotilha foram processados e libertados, os palestinos são indexados, vigiados e contidos para o resto da vida.

A juventude palestina não chega por mar; eles são sequestrados de suas terras. Entram nas mesmas salas de interrogatório, mas sem proteção legal, sem manchetes, sem data de término.

A sua detenção não é um incidente internacional; é rotina.

Seus nomes — Ahmad Manasra, Amal Nakhleh, Ahed Tamimi — surge brevemente, enquanto outros milhares desaparecem no sistema.

Entre eles:

Mohammed El Kurd, detido por sua escrita e resistência em Sheikh Jarrah.

Janna Jihad, um dos jornalistas mais jovens registados, repetidamente assediado e vigiado.

Shadi Farah, preso aos 12 anos e detido por mais de dois anos.

Tareq Zubeidi, torturado e libertado sem acusação, o seu testemunho é uma rara ruptura no silêncio.

Malak al-Khatib, preso aos 14 anos por supostamente atirar pedras.

Obaida Jawabra, baleado e morto após múltiplas detenções, seu nome agora está gravado no arquivo de futuros desaparecidos.

Estes jovens não são anomalias — são a norma estatística de um sistema que criminaliza a infância. Os passageiros da flotilha foram pirateados uma vez; Os jovens palestinos são submetidos à neutralização por toda a vida.

O chão de fábrica: tortura como política

Dentro dessas salas, o propósito do sistema é exposto. De acordo com a rede de prisioneiros palestinos, Samidoun, os detidos, incluindo crianças, podem ser detidos por até 75 dias sem acusações formais. Seus pais não são informados de onde estão detidos e precisam envolver a Cruz Vermelha para descobrir. O aconselhamento jurídico é frequentemente banido por semanas, mesmo durante as sessões judiciais.

Os métodos são sistemáticos e documentados: privação de sono, posições de estresse, espancamentos algemados e ameaças contra familiares. Os detidos libertados testemunharam que foram forçados a ajoelhar-se durante horas ou a cantar canções israelitas. O objetivo é a humilhação e a extração de uma confissão — qualquer confissão — para legitimar o processo. Essa maquinaria está tão arraigada que até as organizações gostam Addameer e Al Haq esse documento é invadido e silenciado.

Conclusão: O Microcosmo e o Macro-Sistema

A violência em alto mar e a violência na cela de interrogatório são calibradas pela mesma lógica: que qualquer resistência ao sistema de controle de Israel, seja de uma criança em Silwan ou de um ativista nas ondas, é um erro de sistema a ser corrigido com força esmagadora e calculada por comandos mascarados ou agentes disfarçados ou policiais de fronteira ou militares.

Os passageiros da flotilha receberam um visto temporário e angustiante para este mundo. A violência contra a flotilha é uma demonstração ao vivo da realidade diária da vida sob ocupação— calibrada, ensaiada e implantada. É a maquinaria diária que governa a vida palestina.

Rima Najjar é uma palestina cujo lado paterno da família vem da aldeia despovoada à força de Lifta, na periferia oeste de Jerusalém, e cujo lado materno da família é de Ijzim, ao sul de Haifa. Ela é ativista, pesquisadora e professora aposentada de literatura inglesa na Universidade Al-Quds, na Cisjordânia ocupada. Ela é pesquisadora associada do Centro de Pesquisa sobre Globalização (CRG).

Imagem em destaque: O mesmo gasoduto processa o activista internacional e o parlamentar palestiniano. O sistema não faz distinção. (Fonte: Rima Najjar)

Fonte

TIMOR: A viagem histórica do Lusitânia Expresso

02.10.25 | Manuel

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Díli, 26 nov (Lusa) – Uma frase em inglês, dita em alto mar por um capitão indonésio, tornou-se numa das mais simbólicas do ativismo político português por Timor-Leste: “This is Papa Kilo Alpha India. Indonesian War Ship. You are now in Indonesian territorial seas”.

“Isto é Papa Kilo Alfa India. Navio de guerra indonésio. Estão agora em águas territoriais indonésias” foi a primeira comunicação do vaso de guerra indonésio colocado a travar o progresso do Lusitânia Expresso, a 11 de março de 1992.

Com mais de uma centena de jornalistas, estudantes e individualidades, entre elas o ex-Presidente português António Ramalho Eanes, a bordo, o navio português partiu com o simples mas polémico objetivo de chegar a Timor-Leste, levando coroas de flores para o cemitério de Santa Cruz.

E ainda hoje, volvidos quase 24 anos desse momento em que o Lusitânia Expresso ouviu a “histórica” comunicação do vaso de guerra indonésio, se debate se o navio estava dentro ou fora das águas territoriais de Timor-Leste.

Independentemente da resposta, para muitos, no momento em que “O Barco das Flores” iniciou o regresso a Darwin, o grande objetivo da iniciativa estava ganho: Timor-Leste manteve-se durante três meses nas páginas dos jornais e nos noticiários das grandes cadeias televisivas.

A grande operação mediática, com mais ou menos polémica, mais ou menos crítica, estava terminada e para trás ficavam dezenas de histórias e de momentos.

Numa conversa com a Lusa em Díli, 10 anos depois dessa viagem, Rui Marques, então do Fórum Estudante e mentor do projeto, explicou que esse momento lhe ficou para sempre gravado na memória.

“Há sempre uma discussão se estava a 14, se estava a 12, se estava a oito milhas. O nosso comandante dizia que já estava nas águas territoriais e os indonésios também”, recorda.

O momento tornou-se importante, também pelas críticas que gerou aos promotores da iniciativa por terem escolhido um comandante “medroso” que se assustou quando confrontado com os navios indonésios.

Rui Marques desdramatizou na altura a questão do comandante e relembrou que o navegador não foi a primeira escolha. “O comandante do navio foi o quarto que tivemos. Houve três que desistiram e creio que este não desistiu porque tinha chegado a Lisboa na véspera da partida do Lusitânia e não percebeu de todo a dimensão do projeto”, contou.

“Ele pode ter tido os seus defeitos, mas de facto foi o único que aceitou e que levou a missão até ao fim, honra lhe seja feita”. E acrescentou que “nunca poderia ter sido um militar” porque seria “desvantajoso” haver qualquer ligação formal ao estado português.

Mais importante do que olhar apenas para o momento da comunicação, realçou Rui Marques, é recordar as “12 longas horas de intimidação” da parte dos vasos de guerra indonésios, que primeiro acompanharam o Lusitânia Expresso “a escassas centenas de metros” e que, já manhã, se cruzam à frente do navio português “fechando a passagem”.

Após a paragem, os promotores defrontam-se com nova crise: um adiamento do regresso impediria as televisões de fazer chegar imagens e notícias nessa noite. O mundo ficaria a saber o que tinha ocorrido pela versão indonésia, filmada de helicópteros que então sobrevoavam o navio português.

Os que argumentam que se deveria ter enfrentado os indonésios “são os que ficaram sentados em casa” e os que “se tivessem sido desafiados para ir, não teriam ido”. “São os heróis de garganta e de sofá que vêm o mundo de pantufas”.

Talvez por ter feito o contrário, e ter aceitado participar, Ramalho Eanes mereça de Rui Marques bastante respeito.

“Tenho muito respeito pelo general Eanes. Muitos outros recusaram porque tiveram medo”. “No momento do encontro com os indonésios, o general Eanes perguntou se eu queria que ele interviesse. Eu disse que não e ele, com muita dignidade, aceitou e disse apenas que não era feito para missões de paz”, disse.

E com o humor possível ‘a posteriori’, Rui Marques aproveitou para recordar que a Missão de Paz a Timor convidou “toda a gente”, começando pelas fileiras cimeiras da vida pública e descendo progressivamente até chegar aos “anónimos que aceitaram ir”.

Salvo algumas mudanças “em aspetos de menos relevância”, Rui Marques garante que “no essencial não mudaria nada”. “O Lusitânia Expresso foi pensado como uma operação mediática, programada com muito rigor e muito cuidado, sabendo exatamente quais eram os objetivos a atingir e procurando estabelecer um patamar equilibrado entre objetivos a atingir e preço a pagar por isso”, disse.

E o balanço foi conseguido, mediatizando-se o problema de Timor-Leste, como lembrou Rui Marques, “graças à ajuda dos indonésios, pelos erros táticos que cometeram”, e evitando um preço “em termos de vidas humanas, quer não só os que iam no barco, quer em Díli e em todo o Timor”.

Eventualmente, se fosse hoje, as coisas poderiam ter sido ainda melhores. Na altura não havia Internet, não havia satélites de televisão a bordo e as personalidades internacionais e portuguesas “poderiam ter sido mais”.

Então fez-se o possível com a tecnologia da altura, com os primeiros grandes diretos “quase” de Timor-Leste para Portugal, ainda que apenas com voz. E que só voltariam a acontecer oito anos depois, em 1999.

 

ASP // VM, Lusa/Fim

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Ver também: A "Missão Paz em Timor" faz 25 anos. Mas continua a ser preciso "arregaçar as mangas"