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TEMPOS DE CÓLERA

A Humanidade é uma revolta de escravos (Alberto Caeiro, Poemas)

Assata Shakur

24.01.23 | Manuel

 

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Afirmação

Eu acredito no viver.
Eu acredito no espectro
dos dias Beta e do povo Gama.
Eu acredito no brilho do sol.
Em moinhos de vento e cachoeiras,
triciclos e cadeiras de balanço.
E eu acredito que sementes tornam-se brotos.
E brotos tornam-se árvores.
Eu acredito na mágica das mãos.
E na sabedoria dos olhos.
Eu acredito na chuva e nas lágrimas.
E no sangue do infinito.

Eu acredito na vida.
E eu vi o desfile da morte
marchando pelo torso da terra,
esculpindo corpos de lama em seu caminho.
Eu vi a destruição da luz do dia,
e vi vermes sedentos de sangue
sendo adorados e saudados.

Eu vi os dóceis tornarem-se cegos
e os cegos tornarem-se prisioneiros
num piscar de olhos.
Eu andei sobre cacos de vidro.
Eu admiti meus erros e engoli derrotas¹
e respirei o fedor da indiferença.

Eu fui trancafiada pelos injustos.
Algemada pelos intolerantes.
Amordaçada pelos gananciosos.
E, se tem alguma coisa que eu sei,
é que um muro é apenas um muro
e nada além disso.
Ele pode ser posto abaixo.

Eu acredito no viver.
Eu acredito no nascimento.
Eu acredito na doçura do amor
e no fogo da verdade

E eu acredito que um navio perdido,
conduzido por navegantes cansados e mareados,
ainda pode ser guiado à casa
para atracar.

¹Do original I have eaten crow and blunder bread. Ambas expressões significam admitir seus erros ou provarem que ela estava errada.

Affirmation (Original)

I believe in living. I believe in the spectrum
of Beta days and Gamma people.
I believe in sunshine
in windmills and waterfalls,
tricycles and rocking chairs.
And I believe that seeds grow into sprouts,
And sprouts grow into trees.
I believe in the magic of the hands.
And in the wisdom of the eyes.
I believe in rain and tears.
And in the blood of infinity.

I believe in life.
And I have seen the death parade
march through the torso of the earth,
sculpting mud bodies in its path.
I have seen the destruction of the daylight,
and seen the bloodthirsty maggots
prayed to and saluted.

I have seen the kind become the blind
and the blind become the bind
in one easy lesson.
I have walked on cut glass.
I have eaten crow and blunder bread
and breathed the stench of indifference.

I have been locked by the lawless.
Handcuffed by the haters.
Gagged by the greedy.
And, if I know anything at all,
it’s that a wall is just a wall
and nothing more at all.
It can be broken down.

I believe in living.
I believe in birth.
I believe in the sweat of love
and in the fire of truth.

And I believe that a lost ship,
steered by tired, seasick sailors,
can still be guided home
to port.

Retirada do livro Assata: An Autobiography, originalmente de 1987, edição da Zed Books no Reino Unido. Relançado, em 2001, nos Estados Unidos com prefácio da Angela Davis.

https://assatashakurpor.wordpress.com/poesias/afirmacao/

Assata Olugbala Shakur (nascida JoAnne Deborah Byron, em 16 de Julho de 1947,  Flushing, Queens): ativista política, foi membro do Black Liberation Army (BLA), escritora e poetisa, vive hoje no exílio em Cuba. Perseguida pelo FBI, fez uma fuga cinematográfica da prisão em 1979 e se engajou na luta internacional anti-imperialista. A pretexto de ter atingido um agente da polícia em tiroteio na New Jersey Turnpike em 1973, o FBI promete uma recompensa de 2 milhões de dólares pela sua detenção.