Contra a conciliação de classes! O 1º de Maio é Vermelho!
Crónica sobre o 1º de Maio em tempo de governo da geringonça (2016) e completamente actual
A saída para a rua dos militares revoltosos a fim de alterar o regime fascista foi antecipada para o dia 25 de Abril porque se previa que a jornada de luta marcada para uma semana depois, 1 de Maio, poderia envolver alguma violência por parte do povo e do proletariado da região de Lisboa e com isso derrubar o regime na rua. Acaba por ser incontornável falar-se de uma data e trazer sempre à baila a outra, se o 25 de Abril acabou por ser a substituição de um regime mais violento de uma pequena fracção da burguesia nacional por um mais moderado e democrático de toda uma classe dominante. Esta, especialmente depois de 25 de Novembro de 1975, teve a necessidade e a arte de transformar a data da luta da classe operária pela sua emancipação numa manifestação inócua, esvaziada de significado, uma espécie de romaria, perfeitamente integrada no establishment burguês e lavada a cabo por uma central sindical e um partido dito comunista cuja preocupação essencial é a manutenção da paz social e garantir a sua sobrevivência, nunca desligada do seu papel de subservientes agentes do capital.
O discurso, tão aguardado e depois tão efusivamente elogiado, à direita e à esquerda do quadro parlamentar e da subserviência da comunicação social e clientelas políticas diversas, do presidente Marcelo (a maior parte das vezes referido apenas como "Marcelo", diferentemente do antecessor que era sempre nomeado pelo apelido e precedido pelo título), apontou para essencialmente três objectivos, reflexo de outras tantas preocupações, e quer a imprensa corporativa quer os diferentes apoiantes não deixaram de salientar: acabar com o "clima de campanha eleitoral", o governo está para governar e durar até ao fim do mandato; "os consensos sectoriais de regime" não são impossíveis mas obrigatórios, por exemplo, saúde, justiça, segurança social, sistema político, em suma, economia e a sacro-santa estabilidade financeira; "a unidade essencial entre os portugueses" não pode ser questionada qualquer que seja a fórmula governativa, seja mais à direita ou mais esquerda (modo PS+BE+PCP). Foi o discurso do consenso, proferido pelo homem cuja essência é o consenso de velha "unidade de todos os portugueses honrados", tão de agrado do PCP de Cunhal e que não provoca grandes náuseas ao novel BE.
O 1º de Maio, que irá ser comemorado no próximo domingo sob a batuta da CGTP, com a adesão entusiasta dos dois partidos que sustentam o governo PS/Costa, que são os dois partidos que em proporção desigual dirigem aquela central sindical, que jamais ousou criar um sindicalismo revolucionário e contra os sindicatos fascistas, mas, pelo contrário, entendeu usá-los para defender (?!) os interesses dos trabalhadores, dizíamos, o 1º de Maio será na linha defendida pelo sr. Rebelo, da "estabilidade" (do regime), que "é um sinal de pacificação democrática que (por sua vez) deve reconfortar os portugueses (os tais honrados e bem-comportados) ". Claro que o discurso do homem, que levou o cravo na mão mas que antes de discursar o "enfiou no bolso" (parece que foi uma grande questão para imprensa e alguns comentadores oficiais se o novo PR iria ao não de cravo na lapela, coisa que o Silva abominava), mereceu rasgados elogios do primeiro Costa, que o considerou "justo" em relação ao passado, "tranquilizador" face ao presente e "motivador" para o futuro; e até o poeta Alegre não se coibiu de poetar que “há qualquer coisa no ar, há qualquer coisa que está a renascer", ao que parece, "um certo espírito de Abril começou a renascer", para mais com "a presença dos militares de Abril", "que há uns tempos que já lá (ao Parlamento) não iam". Porque, precisamente, disse também o Costa, que o actual regime democrático "é em si um enorme consenso". Melhor dizendo e em português corrente, este é o melhor regime político para iludir os trabalhadores fazendo com que se deixem explorar alegre e livremente; e duplamente, porque em tempo de crise e de austeridade sem limite.
O poeta Alegre, isto para salientar o consenso que existe entre as diversas facções e respectivas personagens políticas da burguesia, chegou inclusivamente a admitir a hipótese de votar no sr. Rebelo, caso se recandidate a um segundo mandato, porque "se isto continuar assim" e como "os portugueses (os tais "honrados") precisavam de afecto, de confiança e de esperança... e ele está a restituir isso às pessoas". Como se vê, e na douta e poética opinião, os trabalhadores desde que tenham "afectos" e "esperança", mesmo que não tenham emprego ou o miserável salário que não os retira da situação de miséria quase absoluta, tudo estará bem, desde que ele, poeta do regime, continue a receber uns prémios e haja umas guitarradas para o primeiro Costa e o presidente da câmara de Lisboa possam ganhar ânimo para os cumprimentos oficiais ao PR. Não iremos dizer que "é tudo um putedo!", porque até somos pessoas bem-educadas, mas é tudo a mesma comandita, a mesma cáfila, apesar de alguns discursos mais ressabiados, como o da ex-ministra da Justiça, que ao referir-se ao "salazarismo bafiento" deveria estar a ver o reflexo de algo familiar.
A realidade não se compadece com discursos melosos e demagógicos, se a economia neste principio de 2016 não está a ter o arranque prometido também não está em aberta recessão, parece que o desemprego terá abrandado um pouco, as contas públicas vão atamancando, para desgosto da direita troglodita que agora, na oposição, mostra bem a sua verdadeira face de fascismo bafiento e empedernido, contudo, as nuvens que teimam em surgir no horizonte não prenunciam bom tempo, e espera-se que a recessão económica se venha a abater de forma violenta apesar das medidas do Banco Central Europeu do sr. Draghi, não se sabe é exactamente quando, daí os recados do Rebelo. Quando os cidadãos ficarem fartos do Belém reality show, terão mais olhos para reparar que a política deste governo difere da do anterior em pouco mais do discurso em que é embrulhada, que os prejuízos dos banqueiros vão continuar a ser suportados pelos mesmos de sempre, o povo contribuinte. A seguir ao Banif, para o qual o povo pagou mais de 3 mil milhões de euros, o que permitiu que o Santander tivesse um aumento de lucros de 121% em Portugal, mais dinheiro irá para o do dito Novo Banco, é o outro Costa, o do Banco de Portugal, que o diz, bem como já manifestou o seu desacordo, como se tivesse sido eleito para o cargo, com a lei que possa pôr os bancos a pagar parte do capital aos clientes, acenando com "prejuízos" de 700 milhões de euros por ano, mostrando à evidência a sua função de lacaio dos banqueiros e guardião dissimulador de todas as suas roubalheiras e trafulhices, que constituem na realidade a essência desta economia capitalista, baseada na propriedade privada dos principais meios de produção e de distribuição e cujo objectivo é o lucro, ou seja, a perpétua e interminável acumulação de capital nas mãos em menos de 1% da população, sempre à custa da sobre-exploração dos trabalhadores.
As PPP's, ruinosas para as finanças públicas, continuam, como se tornam abjectas as exigências das concessionárias/bancos a fim de manter rentáveis negócios ilegítimos e até ilegais, contra a Constituição devido aos anexos secretos e pelas rendas exorbitantes garantidas por várias décadas. Agora são "só" 1350 milhões de euros (0,8% do PIB), que a concessionária das A32, a A41 e a A43, que estão na maior parte do tempo às moscas, exige como "reposição de equilíbrio financeiro", denominação elegante para o assalto descarado dos dinheiros públicos. Estas concessões envoltas também em corrupção e tráfico de influências, com muitas luvas a passar por debaixo da mesa, não diferem muito das privatizações, autênticos processos mafiosos de roubo de bens do estado, não sendo por acaso que a PJ, segundo relata a imprensa de referência, esteja a investigar factos relacionados com a subconcessão dos Estaleiros de Viana do Castelo e a venda do navio Atlântida, que envolverão a prática de crimes de gestão danosa, corrupção e participação económica em negócio. Convém lembrar que no centro destes negócios se encontram o ex-ministro da Defesa, advogado com escritório aberto que tem tratado de negociatas com o estado ainda no tempo do governo PS/Sócrates, a Martifer, empresa que nasceu e medrou à custa das câmaras e governos do PSD, e um outro "empresário de sucesso", dono da empresa turística "Douro Azul". Se tivermos em mente o resultado de outras investigações judiciais, tais como BPN e BES, os julgamentos serão para o dia de são nunca à tarde e as sentenças serão todas "pedagógicas" de penas de prisão suspensas, se efectivas, os recursos para as instâncias superiores irão durar eternidades até prescreverem. É que a corrupção é intrínseca ao capitalismo e o PS está, assim como sempre esteve, numa de gestão moralista do capitalismo e da sua máquina administrativa.
Sabemos como funciona a justiça burguesa e que interesses serve, por exemplo, no Luxemburgo é o jornalista francês e dois ex-auditores da PricewaterhouseCoopers que estão a ser julgados, por terem passado ao Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação documentos que provam o esquema de fuga aos impostos por parte de grandes multinacionais, esquema conhecido como LuxLeaks, graças aos bons serviços de Jean-Claude Juncker, quando era ministro das Finanças e mais tarde primeiro-ministro daquele país, que funciona desde há muito como autêntico offshore. E quanto aos tais ditos Panama Papers ainda estaremos sentados há espera por muito tempo de vir a saber quem foram os políticos, os autarcas, os jornalistas, os comentadores televisivos e outros que receberam dinheiro do ex-dono-disto-tudo, o Ricardo 'O Proscrito' Salgado, pela boca do jornal do militante nº1 e agente Bilderberg em Portugal. Quanto aos "empresários de sucesso" seria de igual modo interessante conhecer os nomes de quem contornou o fisco e colocou o dinheirinho em bom recato dos paraísos fiscais (Ângelo Correia nem será o nome mais importante), bem como os dinheiros dos subornos pelas compras escandalosas feitas pelo estado, pelas privatizações, concessões e outras negociatas. Fala-se agora do paraíso Panamá, que até foi considerado local respeitável, recomendável e legal para os negócios dos capitalistas indígenas pelo anterior governo aquando da visita do presidente daquele país, mas há outros mais bem próximos e imunes à devassa, Grã-Bretanha com as suas ilhas, Holanda, os 3 ou 4 pequenos principados europeus, estados artificiais que só o dinheiro das máfias permite a sobrevivência, e a própria Alemanha. É o grande capital financeiro que dita as regras e, até certo ponto, molda a existência dos próprios estados: Mario Draghi diz obedecer somente à lei (do grande capital financeiro) e não aos políticos.
A administração do Novo Banco irá proceder, a partir de 30 de Abril e fazendo fé no noticiado pelo canal televisivo do governo mas ainda nas mãos de administração laranja, ao despedimento colectivo de mais de 4 centenas de trabalhadores, a fim de tornar o banco mais apetecível numa hipotética venda a estrangeiros, o estado, ou seja, o governo é neste momento o patrão e será igualmente responsável por este significativo contributo para o aumento do desemprego no país. Os estivadores decidiram estender a greve às horas extraordinárias até ao dia 27 de Maio, não colocando em perigo qualquer necessidade social essencial por este tipo de greve ser bastante limitado, no entanto, o governo entendeu decretar serviços mínimos; onde está a CGTP? e Arménio Carlos? e o PCP? Cada vez mais o governo Costa/PS mostra de que lado da barricada se encontra.
A luta contra o desemprego está na ordem do dia, apesar dos números contrários da estatística oficial, a luta contra a precariedade encontra-se lado a lado, como bem demonstra a luta tenaz levada a cabo pela classe operária e pela juventude estudantil francesas, uma luta contra a alteração das leis laborais, mas que em Portugal terá de passar pela revogação de todas as alterações do Código do Trabalho, que foram justificadas pela crise e pela troika e de que o CGTP/PCP e BE se têm esquecido, assim como a luta pelas 35 horas semanais tanto no sector estado como no privado deve ser mais uma inscrição na bandeira do 1º de Maio de 2016. Este 1º de Maio será um acto inútil, e mais uma passeata pela Almirante Reis acima em Lisboa, se não tiver como pano de fundo a exigência da saída do euro e da União Europeia e o não pagamento da dívida odiosa. Será mais um episódio na concertação social e na conciliação de classes, traduzindo mais uma vitória do Capital sobre o Trabalho. Para destruir as cadeias que nos amarram, nós trabalhadores, e os proletários em particular, teremos de acabar com o capitalismo, antes que ele acabe com a própria humanidade, e construir no seu lugar uma economia e uma sociedade socialistas, sem opressão e exploração, visando como fim último a sociedade sem classes.
O 1º de Maio é de Luta e é Vermelho!
29 de Abril 2016