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TEMPOS DE CÓLERA

A Humanidade é uma revolta de escravos (Alberto Caeiro, Poemas)

Os invernos vulcânicos e o ano sem verão

19.06.23 | Manuel

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por Manuel Fernandes*

Escrito em 2021 e a propósito das ditas “alterações climáticas”

A outra agenda do capitalismo, para além da pandemia covid-19, são "as alterações climáticas provocadas pela acção humana", apresentadas como se todos os humanos fossem responsáveis, e não pela economia capitalista que é a realidade sempre ocultada, ou as alterações climáticas não fossem uma constante no planeta desde a sua origem.

Este ano de 2021 parece ir contrariar um pouco os defensores da agenda do aquecimento global, apesar de ter havido uma intensificação da actividade solar, é que já entraram em erupção nada menos do que oito vulcões: nas Caraíbas (La Soufrière na ilha de S. Vicente), na Costa Rica (Rincón de la Vieja), na República Democrática do Congo (Monte Nyiragongo), na Indonésia (Monte Merapi e Monte Semeru e onde há 130 vulcões activos), na Islândia (Monte Fagradalsfjall, estando em actividade há mais de seis meses!) e agora nas Canárias (Cumbre Vieja)e na Sicília (Etna, que está em actividade intermitente desde o princípio do ano). E no mês de Dezembro de 2020 tinham entrado em erupção três: Fuego e Pacaya, no sul da Guatemala, e White Island na Nova Zelândia.

Esta actividade está a produzir uma enorme quantidade de cinzas e de gases que ficarão na estratosfera, levando à formação de um “chapéu” que impedirá a passagem dos raios solares e, assim, conduzindo ao arrefecimento do planeta. Ou seja, um pouco como a Fundação Bill e Melinda Gates pretende fazer com o lançamento através de balões de carbonato de cálcio a fim de provocar o arrefecimento, mas de forma artificial e de consequências imprevisíveis.

Afirmar-se, como temos ouvido à imprensa corporativa, que os meses de Julho e de Agosto, foram os meses mais quentes na Europa nos últimos anos, embora não tenhamos dados, parece-nos um exagero propagandístico, porque em Portugal este Verão está bem longe de ser um dos Verões mais quentes dos últimos anos, bem pelo contrário. E será devido à erupção pouco vulgar de vários vulcões em curto período de tempo e em quase simultâneo que este Inverno possa vir a ser um Inverno particularmente frio e rigoroso. E não tendo nada a ver com a concentração do CO2.

Vem agora a agenda das alterações climáticas, escondendo-se o facto que as alterações climáticas no planeta Terra são a constante e não a excepção. Foi graças a uma grande alteração no clima, provocada pela queda de um meteoro e de muito provavelmente de simultâneas movimentações e choques de placas tectónicas, que os grandes répteis desapareceram e se criaram as condições para que os mamíferos, pequenos animais nocturnos, se pudessem desenvolver; e entre eles, os primatas, grupo a que nós, humanos, pertencemos e que vieram a dominar.

E foi também graças à formação da cordilheira do Rifte, provocada pelo deslocamento de placas tectónicas, que, impedindo a passagem dos ventos, levou à substituição da floresta pela savana na região oriental de África, que os primatas foram obrigados a saltar das árvores e a deslocar-se na posição bípede, e um deles terá sido o nosso ancestral há cerca de 7 a 8 milhões de anos. E foi esse antepassado que terá dado origem aos hominínios, dos quais o único sobrevivente é o homo sapiens sapiens, ou seja, os humanos modernos, que somos nós. Se não fossem as alterações climáticas profundas, não existiríamos. Simples.

As presentes alterações climáticas, embora tenham uma componente humana na sua génese, são provocadas principalmente pelas alterações da actividade do sol e que poderão durar uns 20 a 25 anos, como já aconteceu no passado. Mas há um outro factor que já ocorreu há 75 mil anos e mais recentemente há cerca de 200 anos, mais precisamente em 1815, com a erupção do vulcão do monte Tambora, na ilha de Sumbawa, na Indonésia, que, pela grande quantidade de gases, cinzas e de poeiras, provocou um Inverno durante todo o ano seguinte, em que praticamente não houve sol em quase todo o planeta, levando à destruição das colheitas e originado uma vaga de fome generalizada.

Temos de perceber o porquê da agenda climática neste momento, é que a pandemia do sars-cov-02 está a esgotar-se e, antes que se descubra o logro e o povo se revolte, é preciso criar outra “pandemia”, a das alterações climática vem a calhar. A razão é económica: a taxa de lucro chegou a zero e há uma crise de superprodução. Como a guerra tem sido a receita habitual para o capitalismo se poder relançar, então, arranjam-se outras “guerras”, porque uma guerra mundial à semelhança das duas anteriores é agora empreendimento mais do que arriscado, na medida em que há o perigo de não ficar cá ninguém para contar o que se passou.

As novas guerras ou são “pandemias” ou “transições”. A transição energética é para ser feita à custa de mais impostos e não por capitais próprios das grandes empresas privadas. Culpabilizar os cidadãos pela poluição dá jeito para que estes se disponibilizem pacifica e voluntariamente a deixarem-se explorar mais um pouco, porque para o grande capital o resultado terá de ser sempre mais riqueza e lucros a crescer imparavelmente.

A revolta dos “coletes amarelos” em França teve na sua origem o aumento incomportável do preço dos combustíveis e a população que mais atingida foi exactamente a população das pequenas cidades da província. Revolta que foi apenas colocada em modo pausa pela pandemia covid-19; tendo sido esta criada exactamente com esse objectivo: o controlo social e o apaziguamento da luta de classes. A revolução seguirá sempre dentro de momentos, no planeta e na humanidade.

*

O ANO SEM VERÃO (Texto interessante do paleontólogo Juan Luis Arsuaga)

A maior erupção vulcânica de que temos um registo histórico amplo foi a do ano de 1815, quando entrou em atividade o vulcão do monte Tambora (na ilha de Sumbawa, na Indonésia). Os efeitos dos gases produzidos pela erupção na atmosfera alargaram-se a todo o planeta. Como se fosse pouco, a erupção ainda coincidiu com uma quebra na atividade solar e tudo isto aconteceu, além disso, num período muito frio da História recente conhecido como Pequena Idade do Gelo, em que os glaciares se expandiram. No ano seguinte, 1816, já não houve verão na Europa. Choveu durante quase todos os dias e não houve sol. As colheitas perderam-se, a fome alastrou e o mal-estar social fez-se sentir em muitas regiões da Europa, da Ásia e da América do Norte.

Em junho de 1816, numa villa em Genebra, nas margens do lago Leman, estava a passar férias um grupo de intelectuais ingleses, entre os quais se encontravam lorde Byron, o poeta Percy Shelley e Mary Shelley (que ainda não eram casados) e o médico John Polidori. Entediados com tanta chuva e frio, passaram o tempo a contar histórias assustadoras, tão escuras como a cor do céu. Dessas conversas saiu a inspiração para o famoso romance Frankenstein, de Mary Shelley (nessa altura, uma jovem de 19 anos), e para O Vampiro, de Polidori, que foi a origem das histórias de vampiros aristocráticos que mais tarde apareceram.

Porém, esta famosa erupção vulcânica foi muitíssimo menor do que aquela que ocorreu uns 75 mil anos antes em Sumatra (o vulcão de Tobal) e que há de ter afetado os seres humanos - e todos os restantes mamíferos -, porque a redução da luz solar foi muito marcante. É possível que tenha diminuído drasticamente o número de pessoas vivas, embora tenhamos conseguido sobreviver como espécie. Recentemente foi publicado um trabalho sobre dois núcleos arqueológicos sul-africanos (em Pinnacle Point) em que há vestígios da vida humana durante esses anos. Apesar da catástrofe, parecem ter conseguido viver muito bem. Contudo, também pode ter acontecido que o facto de ser uma zona de costa, com uma grande variedade de recursos, os tenha ajudado a sobreviverem, por a região ser menos afetada do que o interior do continente pela megaerupção vulcânica.

In “A Vida, a grande história” de Juan Luis Arsuaga. Temas&Debates, 2021

*Mestre em Evolução Humana

21 Setembro 2021